quinta-feira, 30 de maio de 2013

Iracúndia

Isto de fazer todas as vontadezinhas a Deus tem de acabar. Ele que não pense, o prepotente, que lá por ser omnipotente faz de mim um impotente. 

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Pedido de informação



Alguém sabe dizer-me qual o número e a respectiva paragem da carreira para longe desta insuportável parvalhice? A capitania do meu desalento agradece a gentileza.

domingo, 19 de maio de 2013

Regras de conduta


A um indignado da minha estirpe jamais se pergunta “o que tens feito”. Muito francamente, considero tal interpelação uma ofensa. Perguntem-me preferencialmente “o que tens desfeito”. À primeira questão recuso-me determinantemente a responder; à segunda, creiam-me, responderei com o mor agrado e a mais profunda obsequiosidade. 
Como diz esse eminente filósofo chamado Povo: " o respeitinho é muito lindo e eu gosto". 

Quando a mediocridade já enfastia



Há indivíduos que debitam tiradas que, na minha franca e lúcida opinião, vão certamente buscá-las ao fundo de latas de diluente ou a embalagens de aspirinas contrafaccionadas. Depois ainda se admiram que nós, que as escutamos ou lemos, suportamos e digerimos, andemos constantemente constipados, com carunchentas artroses, dores menstruais no aparelho auditivo e o mal da couve-flor. Com tamanhas afrontas ao intelecto e respectivas filiais, estavam à espera de quê, hein? De uma frondosa procissão de domingo de Ramos ou de um bacalhau à Agostinho da Motoreta? Enxerguem-se, meus caros, e parem de açoitar a inteligência de quem a tem com a chibata da vossa ignorância. De filosofismos anda a filosofia empanturrada. Dediquem-se a propósitos mais proveitosos e levantadores, seus escarradores de despropósitos. O mundo, a vida e os seus condóminos ficar-lhes-ão imensamente gratos. 

segunda-feira, 13 de maio de 2013

A vida



Uns apelidam-na tão-somente assim. Outros há, mais eloquentes talvez, que preferem designá-la de puta da vida. Eu, que não sou de todo dado a trivialidades, chamo-a apenas de puta, em toda a extensão da palavra.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

Confidência


Desperdiçador de dádivas, até agora tenho desperdiçado a minha vida nos desperdícios da rotina, nos desperdícios do banal, do mundano, do quotidiano. – Isto é desperdiçar a vida. Ao mesmo tempo, a vida, pródiga desperdiçadora, tem-me desperdiçado, supremo desdém,  severa e escarnecidamente. Talvez seja este o prémio a pagar por aquilo que tenho feito: ter-me tornado desperdício da própria vida. 

Centelha


Deus devia conceder-nos duas vidas: uma para a vivermos, a outra para lermos todos os grandes livros.     (dinismoura) 

Hélas seguido de… nada de especial



Quando criança descobri que não tinha nenhuma vocação para adulto, hoje, adulto, acabo de descobrir que não tenho vocação alguma para a vida. Entretanto, ocorre-me perguntar: e a vida, acaso terá vocação para alguma coisa? 

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Aos interessados em emigrar




Qual Suíça, qual Luxemburgo, qual Angola, qual Brasil, qual não sei quê. Neste momento o melhor país como destino de emigração é o Irão. Quando não, reparem. Soube recentemente que um pedaço de urânio oriundo das minas da Urgeiriça decidiu partir rumo a esse território outrora denominado Pérsia. Pois fiquem sabendo que para alcançar o patamar que a grande maioria dos emigrantes leva quarenta anos a conseguir, uma vida portanto, bastaram-lhe dois meses. Regressou há poucos dias, enriquecido. Em dois meses um pedaço de urânio português saiu enriquecido do Irão. É deveras notável. Ao que pude apurar, a sua curta estadia foi dividida entre o Centro de Física Atómica da Universidade de Teerão e uma central nuclear localizada no sul do mesmo país.
Posto isto, por que esperam? Comprem as passagens, façam as malas e sem mais delongas rumem em direcção a esse eldorado do Médio Oriente. 

terça-feira, 7 de maio de 2013

Louvor da Jeropiga




Dois compadres de longa data, dois entendidos e esmerados apreciadores da bebezaina, numa pequena adega, lá para os lados de nenhures, em plena Beira Baixa, saboreando o resultado final das veneráveis alquimias do mosto e da aguardente.  
Um sonoro e tilintante brinde dá início à liturgia da entorna.
- “Huuummm! Que fabulosa jeropinga! Sim, senhor! Saiu-lhe mais sagrada que a Nossa Senhora! Pinga no estômago como chocolate, compadre! Mas que fabulosa jeropinga, caneco! Nem sabe a preciosidade que aqui tem na capela.”  
Depois de minuciosamente escorropichados copo e garrafa, um tanto emocionado pela  graça concedida por Baco, outro tanto inspirado pelos vapores do esplêndido néctar, rematou numa toada de ornatos oratórios:
- “C’um caneco! Esta pinga é daquelas que põe a alma a assobiar e o esqueleto a dançar. Abra outra, compadre, para comemorarmos: o precioso acontecimento bem o merece. Bote aí. “

dinismoura

A propósito da minha candidatura a coisa nenhuma




Quantas vezes terei de reiterar aos excelentíssimos senhores jornalistas que eu,  na minha condição de candidato a coisa nenhuma, não presto declarações nem a RTP’s, nem a SIC’s , nem tampouco a TVI’s. Eu já afirmei e torno a afirmar: eu só falo para o Canal da Mancha – e ponto final. 

Calendário de Eventos


Hoje é o Dia Mundial do Banho-Maria. Já pensaram como vão comemorar? Eu vou dar banho ao cão e levar a maria ao cinema. 

Tiradas pantagruélicas


De um conhecido gastrónomo e inspector da Michelin, regaladíssimo, consoladíssimo, depois de degustar um celestial povo à lagareiro, numa elísia tasca do Bairro Alto:
“Jesus! Há anos que não comia um molotov assim!” 
dinismoura

segunda-feira, 6 de maio de 2013

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Portugal já não faz parte da Europa, já não faz parte do Euro, já não faz parte da realidade. 
Portugal ora não mais é que a anémica e envergonhada miragem de uma porção de lama sacudida para a extremidade mais ocidental do Velho Continente, este um torrão à mercê de insondáveis desígnios. 

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Carta a Rui Zink


Caro colega e comensal neste banquete de açorda insulsa que é a vida,

Tomei a liberdade de dirigir-lhe esta curta missiva porque, primeiro, a minha lauta ignorância não me permite alcançar sequer os arrabaldes da metafísica, domínio esse que é da sua alçada; segundo porque tenho para mim convictamente assente que o seu trato com os assuntos surreais e transcendestes lhe é congénito, fácil e desembaraçado. Bem sei que o propósito, e verá já, é supinamente despropositado, mas creia-me que não é de propósito.
Saiba pois que ultimamente tem adentrado o meu intelecto um desassossego daqueles que esboroam os neurónios e destabilizam a jurisdição do epigástrio. Um suplício sem precedentes em toda a filosofia, asseguro-lhe.
Sucede que uma questão visceralmente ontológica, imanente e transcendente impede o decurso normal da minha existência: Porquê? Ah, a imundice desta questão, a sua constante presença, sombra e reflexo desconserta-me todos os mecanismos da alma. Sinto molas a saltar, parafusos a quebrar, juntas a ceder. Porquê? Não logro uma resposta, não ouso aventar uma hipótese. Porquê? Este nó cego cega-me o fluir das cogitações. Porquê? Este dissílabo monocordiza a polifonia do brotar da minha poesia. Porquê? Porquê? Detrás dos muros desta questão antevejo a loucura. Ei-la, ali, zombeirona, a ridiculizar-me. Note o seu escarnecedor semblante! Que cólera! Que cólera! Ajude-me, caramba!
Caro colega, ajude-me, reitero o rogo. Ponha término a esta afronta, a esta sucessão de noites insones e despertares sonambúlicos. Ajude-me, imploro-lhe. Só uma alma omnisciente como a sua pode valer-me.

Submerso no lamaçal de tudo isto, mui respeitosamente e atarantado subscrevo-me,
dinismoura. 

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Vicissitudes de uma sociedade alienada


Não há muitos dias, um periódico alemão publicou uma sondagem indicando que 21% dos alemães com idades compreendidas entre os 18 e 29 anos não sabem que Auschwitz - esse terrífico pecado da humanidade- foi um campo de extermínio.  Não raro, estas  notícias são bastas vezes remetidas para os recônditos das páginas dos jornais e revistas, quando, precisamente,  deveriam surgir, em caracteres garrafais, berrantes e apelativos, nas manchetes dos mesmos. Resulta curioso ver como este significativíssimo quinhão de jovens ignora as atrocidades perpetradas, num passado não muito distante, pelos seus avoengos. Quando me deparei com isto, de imediato me ocorreu uma reflexão  de George Santayana, que diz, e passo a citar: "aqueles que esquecem o passado estão condenados a repeti-lo". Assertivas, convenientes, acertadas, as palavras do pensador americano.